Educação: Modalidade tem cerca de 800 mil alunos em 145 instituições
Luciano Máximo, de São Paulo
O administrador de empresas Espedito Xisto, de 57 anos, já fez uma pós-graduação a distância e agora cursa a graduação de logística: "Estudo no meu ritmo"
Na agenda do administrador de empresas Espedito Xisto, de 57 anos, o horário reservado aos estudos nunca é fixo. Disciplinado, ele assiste a uma videoaula na segunda-feira de manhã, resolve exercícios e se dedica a leituras à noite, depois do trabalho, ou ainda separa as tardes de domingo - logo após o almoço em família - para fazer as pesquisas da graduação de Logística, segundo curso a distância que "frequenta" em cinco anos.
Uma vez por semana Xisto se desloca de São Bernardo do Campo para o polo de ensino presencial da Universidade Metodista em Mauá, na região metropolitana de São Paulo, para ter aulas, fazer provas e tirar dúvidas com tutores - atividades obrigatórias em toda graduação aberta certificada pelo Ministério da Educação (MEC). "Não acho produtivo estar numa classe para receber um monte de informação, que, dependendo da capacidade de absorção de cada aluno, pode ou não ser aproveitada. O ensino a distância é extraordinário porque permite adquirir conhecimento e também o diploma num ritmo próprio", diz.
A maior possibilidade de acesso à universidade - basta um computador conectado à internet e dedicação -, aliada à flexibilidade no roteiro de estudos e ao controle de qualidade dos programas, justificou um crescimento médio anual de mais de 65% das matrículas de graduação a distância no país entre 2002 e 2008. Nesse período, a participação da modalidade no universo atual de 5 milhões de alunos da educação superior presencial brasileira aumentou de 1% para 15%. O percentual representa 791 mil pessoas distribuídas em quase 650 cursos oferecidos por 145 instituições credenciadas (91 públicas e 54 particulares).
Considerando apenas os novos alunos, 20% dos ingressantes já preferem a modalidade a distância, de acordo com estatísticas de 2008 - as mais recentes - organizadas pelo consultor Fábio Sanchez, um dos coordenadores do Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância.
Para ele, a informação revela uma mudança no perfil do universitário brasileiro e do sistema de ensino superior. "É um em cada cinco jovens! Isso mostra que há cada vez menos preconceito sobre o método e que paradigmas como sala de aula ou semestre letivo começam a se tornar cada vez menos importantes. A autonomia do aluno passa a ser mais valorizada", avalia Sanchez.
O mercado também parece não demonstrar restrições. "Em 2006, 2007, soube de problemas de contratação, mas os cursos ganharam credibilidade hoje", acredita Xisto, que, apesar de aposentado, presta serviços na área de logística a um fornecedor da Volkswagen e espera melhorar na empresa. "O curso ajuda no meu trabalho e sei que estão de olho na minha experiência e no que eu posso oferecer."
Segundo Fredric Litto, presidente da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), indústria e comércio não procuram apenas competência legal, querem competência real. "Apenas 13% dos jovens de 18 a 24 anos estão no terceiro grau, o ensino a distância permite uma inclusão maior de jovens no terceiro grau." Litto diz que os cursos a distância livres e de especialização e programas online de treinamento corporativo também crescem em ritmo intenso, somando mais de 1,5 milhão de usuários.
Carlos Eduardo Bielschowsky, secretário de educação a distância do MEC, acredita que a disciplina e dedicação exigidas na modalidade são bem vistas no mercado. "Além disso, as pessoas da educação a distância são bem avaliadas e já estão empregadas."
Levantamento do MEC mostra que alunos das graduações mais representativas do ensino a distância, como administração, ciências sociais, turismo, pedagogia e matemática, têm notas maiores que seus pares da universidade tradicional no Enade, o exame de avaliação dos universitários. Além disso, a maioria dos graduandos a distância trabalha em tempo integral, é mais velha e tem renda mais baixa.
Bielschowsky destaca que, por lei, ensino a distância e presencial são "academicamente" equivalentes. "É preciso passar no vestibular presencial para entrar, fazer provas e trabalhos e se dedicar bastante. Muitos alunos acham que vão aprender naturalmente, mas muitos não se adaptam", diz.
Engenheiro mora no Japão e faz MBA na FGV
Em 1996, a Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB) instituiu o ensino a distância no Brasil, mas a atividade só decolou a partir de 2005, com a criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB) e uma aposta mais firme da iniciativa privada no setor.
Instituição virtual, a UAB agrega 50 universidades federais, 16 estaduais e 15 institutos federais de ensino tecnológico (Ifets), pulverizados em mais de 550 polos para atividades presenciais em todas as regiões do país. Eles atendem a 170 mil graduandos (20% do total na modalidade) e 80 mil alunos de especialização. O sistema prioriza a formação de professores da educação básica ainda sem diploma superior e administradores, enfatizando a gestão pública.
O secretário de educação a distância do MEC, Carlos Eduardo Bielschowsky, disse que o objetivo da atual política é terminar 2012 com 600 mil alunos matriculados na UAB. E não faltarão recursos: "O orçamento atual da UAB, de R$ 650 milhões, vai chegar a R$ 1 bilhão até 2012 e pode ainda crescer mais. O ministro [Fernando Haddad] trabalha com uma tendência de adensar ainda mais os polos."
Ele disse também que o governo trabalha na instalação de 193 novos polos em parceria com Estados e municípios para ampliar e "interiorizar" a oferta. "Uma das funções da educação a distância é chegar em lugares onde não há ensino superior de qualidade."
Uma das preocupações do MEC é preencher o vazio deixado pelo fechamento de mais de 5 mil polos irregulares desde o início das ações de supervisão, em 2008. Apuração do Valor com base em dados oficiais mostra que os 5.472 polos presenciais, da UAB e de outras instituições particulares, estão localizados em 1.531 municípios - cobertura de apenas de 27% do território nacional. "Não é suficiente, mesmo assim o atendimento chega a 70%, 80% da população. Também é importante dizer que a meta não é estar em 100% das cidades, porque o aluno não precisa frequentar o polo diariamente", argumenta Bielschowsky.
O caso do engenheiro de alimentos Aliandre Avanzo, de 37 anos, gerente de contas da BR Foods, mostra como o ensino a distância pode superar limites geográficos. Há menos de um ano, ele foi transferido para a unidade da empresa no Japão e, motivado com a nova função, decidiu se especializar na área financeira, de olho em novas oportunidades.
A melhor opção encontrada foi o MBA de finanças com ênfase em banking da Fundação Getulio Vargas (FGV) - distante quase 20 mil quilômetros do Japão. "Primeiro li muito sobre o assunto, como é o processo de aprendizado, procurei instituições de ensino respeitadas e também entrei em contato com pessoas que já fizeram algum curso a distância", conta Avanzo.
O começo não foi fácil, ele não esperava carga tão grande de conteúdo e atividades que valiam nota. "Estudar sozinho no início era muito difícil, é preciso disciplina e 2 horas de estudo por dia. Os materiais online, os softwares usados para a pesquisa também ajudam, por isso é importante a escolha de uma instituição de referência", aconselha o aluno, que vai desembolsar cerca de R$ 20 mil pelo MBA, de dois anos de duração.
E as provas? O MEC exige que as avaliações dos cursos a distância sejam aplicadas presencialmente. "Tiveram que abrir uma exceção, afinal atravessar o mundo ao fim de cada módulo iria me levar à falência", brinca Avanzo. O aluno fez um acordo prévio com a FGV para fazer as provas pela internet, com tempo cronometrado e monitorado por câmera pelos tutores do MBA. "Eu não posso sair da frente do micro a partir do momento que o arquivo é disponibilizado na rede. É uma hora e meia para responder dez questões. Não dá tempo de olhar para o lado, imagina pensar em colar." (LM)
Serviço
Atualmente, mais de 1.750 cursos a distância (técnico, graduação, pós-graduação e especialização) são ofertados no Brasil. O Ministério da Educação (MEC) analisa o credenciamento de 23 novos programas em todo o país. De acordo com especialistas do setor, escolhas equivocadas e perfil inadequado para a modalidade justificam um alto índice de desistência de quase 20%. Antes da matrícula, eles recomendam ampla pesquisa sobre a instituição de ensino, o projeto pedagógico e conversar com alunos e ex-alunos. A revista online ?Ache seu Curso a Distância? conta com ferramenta de busca de centenas de atividades. O MEC disponibiliza para consulta na internet lista de polos brasileiros de ensino a distância por Estados e regiões. Já o site ?Open Course Ware? oferece gratuitamente o conteúdo online de 1.900 programas ministrados no conceituado Massachusetts Institute of Technology (MIT), de literatura a varias categorias de engenharia, de antropologia a ciências neurológicas.
www.acheseucurso.com.br
siead.mec.gov.br;
www.ocw.mit.edu
Fonte: Valor Econômico
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